Acidente do trabalho: erros e desacertos nas perícias

Acidente do trabalho: erros e desacertos nas perícias

Dr. Antonio Carlos Vendrame

12 de dezembro de 2023

O tema acidente do trabalho ainda é novo quando se trata de perícia na Justiça Trabalhista.

Tanto os Juízes quanto os Peritos receberam as ações oriundas da Justiça Civil de forma abrupta e, ainda que tenham se passado mais de 10 anos, o assunto ainda é um tanto nebuloso.

A análise do acidente do trabalho propriamente dita ainda é feita por meio de checklist de cumprimento de legislação, especialmente das Normas Regulamentadoras. Acredita-se que o descumprimento de itens da legislação é pressuposto para a caracterização da culpabilidade da empresa.

É óbvio que a evidência do descumprimento da legislação está diretamente ligada ao quanto a empresa é negligente com a questão de segurança e saúde no trabalho. Mas daí afirmar que a empresa é culpada por um acidente, estaríamos percorrendo um longo caminho da imaginação tendenciosa.

A verdade é uma só: a grande maioria dos Peritos incumbidos de realizar perícias de acidente do trabalho não sabe realizar análise de risco! Somente uma análise de risco pode mostrar com fidelidade a real ou reais causas de um acidente.

 

Classificação das causas de um acidente do trabalho

Há várias formas de classificar as causas de um acidente. Uma delas vamos comentar.

As causas de um acidente podem ser classificadas em:

 

1. Imediatas

As imediatas são constituídas por razões mais óbvias da ocorrência de um acidente, evidenciadas na proximidade das consequências.

As causas imediatas são as mais óbvias e, nem precisam de análise de risco para serem evidenciadas. Basta olhar em volta do acidente para percebê-las por simples intuição.

 

2. Subjacentes

As subjacentes são razões sistêmicas ou organizacionais menos evidentes, porém necessárias para que ocorra um incidente.

As causas subjacentes não são vistas a “olho nu”, é preciso puxar um pouco mais a linha do novelo para descobri-la.

 

3. Latentes

As latentes são condições iniciadoras que possibilitam o surgimento de todos os outros fatores relacionados ao acidente.

Frequentemente são remotas no tempo e no que se refere à hierarquia dos envolvidos, quando consideradas em relação ao evento. Geralmente envolvem concepção, gestão, planejamento ou organização.

As causas latentes não são descobertas por simples intuição ou mesmo observação. Elas aparecem como resultado de uma análise de risco bem elaborada.

Normalmente um acidente não possui causa única e, sem uma análise, fatalmente teremos as causas imediatas, ficando as subjacentes e latentes ocultas, quando então parecerá que descobrimos a causa do acidente, no entanto, outras ainda se encontram não reveladas.

 

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Efetividade da perícia

As ideias pré-concebidas sobre a causa do acidente podem cegar o Perito Judicial em sua análise. Acreditar saber tudo certamente implicará no comprometimento da perícia.

 Uma perícia efetiva requer uma metodologia estruturada para coleta, organização e análise das informações.

O pior inimigo da perícia é o tempo que se passou desde o acidente até a perícia, o que implicará em testemunhos deficientes, falta da cena do acidente, não preservação de equipamentos ou ferramentas e outros fatores que se perdem no tempo.

Um bom começo seria formular hipóteses que explicassem o acidente e através de evidências poder confirmar ou rejeitar tais hipóteses.

A princípio nenhuma hipótese, por mais esdrúxula que seja, pode ser descartada, nem mesmo suicídio. Em várias oportunidades nos deparamos com suicídios que pareciam acidente de trabalho.

 

Acidente do trabalho: todas as evidências são importantes

Todas as evidências são importantes, desde a oitiva de testemunhas, relatórios elaborados pela CIPA, informações da área médica, análise do acidente realizada pelo SESMT, etc.

Porém, devem ser examinados com muita cautela documentos relativo ao acidente produzidos pelos entes governamentais de uma forma geral, tais como Polícia Técnica e Ministério do Trabalho, especialmente quando seus signatários não forem engenheiros de segurança ou médicos do trabalho.

Invariavelmente tais documentos, sem qualquer análise mais profunda, atribuem culpa à empresa, por mera e tendenciosa ideologia política travestida de filosofia.

O erro humano existe e, pode contribuir grandemente para a ocorrência de um acidente. Quantas vezes falhas de julgamento, de memória, de comunicação acabam num grave acidente.

O ser humano é muito vulnerável quanto ao erro e, seu processamento mental não é infalível. Basta observamos quantas ações fazemos no “piloto automático” como dirigir, cozinhar e trabalhar.

 

Reconstituição do acidente e linha do tempo

Reconstituir o acidente seria outra boa forma de realizar a análise pericial. Nesta reconstituição são evidenciados todos os testemunhos inverdadeiros e até mesmo falsos.

A perícia precisa estar atenta àqueles testemunhos que não presenciaram o acidente, mas tão somente tiveram notícia deste e, mostram-se como testemunhas oculares.

Construir uma linha do tempo é um ótimo referencial para o estudo das causas do acidente. A linha do tempo é uma descrição cronológica dos fatos anteriormente ao acidente até o momento deste.

Podemos voltar a alguns minutos antes do acidente, como poderemos voltar a dias, meses e até anos antes do acidente.

A construção da linha do tempo permite verificar fatos, situações ou condições não visíveis inicialmente (parte submersa do iceberg).

É impossível falar tudo o que deveria ser feito durante uma perícia de acidente do trabalho num único artigo, mas esperamos que este seja, ao menos, um princípio de como analisar um acidente do trabalho.

Quer saber mais ou ficou com alguma dúvida sobre erros e desacertos nas perícias de acidente do trabalho? Entre em contato conosco. Nós podemos ajudar!